Multiplicação de perfis em redes sociais estimula a desconfiança entre casais
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CACÁ JUNQUEIRA
»»»A maioria das pessoas diz que a vida a dois é boa, mas não é fácil. O problema se agrava principalmente quando temos um companheiro(a) e um cadastro em uma rede social na internet.
Para alguns casais, partilhar senhas de internet é invasão de privacidade. Para outros, algo desnecessário. Mas, entre os casais ciumentos, compartilhar, em tempos de redes sociais, virou uma maneira simples de dizer “não estou te traindo”.
Ao mesmo tempo, contudo, a vida dos puladores de cerca ficou muito mas difícil. No Facebook, o vestígio de uma deslealdade pode ser encontrado no perfil do parceiro. No Twitter, saber quem é o novo seguidor (em geral do sexo oposto) já é um grande passo para uma nova investigação. Isso sem contar as contas de e-mail, que hoje em dia armazenam grandes quantidades de informações pessoais.
No auge do seu namoro, aos 21 anos, uma estudante de publicidade do interior de São Paulo, que não quis se identificar, conseguiu entrar no Facebook do seu namorado. O garoto, distraído, tinha deixado a senha da conta gravada na página do site e emprestou o laptop para a namorada sem nem desconfiar do que estava por vir.
Disfarçadamente, ela entrou de mansinho na página da rede social e descobriu o inesperado. Surpresa! Ele trocava recados reservados (“inbox”) com outras garotas, e, além disso, convidava-as para sair. Para ela, o fim foi imediato. Atirou o computador contra ele e foi-se embora.
Para a maioria dos casais, futricar os recados recebidos e as fotos marcadas do seu amor é normal, pois o que está na rede é para ser visto. No entanto, mesmo sabendo que poderia estar fazendo a coisa errada, ela não resistiu em entrar na área privada da conta do então namorado. “Eu sempre tinha o pé atrás, mas não imaginava que ele me traía”, disse a garota.
A psicóloga Rita Oliveira Fernandes de Melo ensina que antes de desconfiar da traição, um diálogo sincero entre o casal é a melhor opção para diferenciar se as situações são criadas pela mente ou se são verídicas. “O ideal é discriminar se existe algo real acontecendo ou se é apenas uma fantasia criada pela baixa auto-estima.”
As redes sociais foram criadas como meio de comunicação entre amigos, e não, a princípio, com o intuito de facilitar traições. No entanto, ao colocar os indivíduos em contato, como faz o Facebook, expondo a vida das pessoas através de fotos, vídeos e comentários, a exposição da intimidade pessoal se torna grande. E, com isso, as ferramentas da web multiplicaram os flagras na internet.
E isso vale para ambos os sexos. “A traição masculina ainda é vista como algo normal, e a feminina é coisa de mulher ‘sem vergonha’”, diz Rita. Porém, segundo a psicóloga, o número de mulheres que traem seus maridos vem aumentando. O motivo é a insatisfação nos relacionamentos.
Mesmo diante do flagra, contudo, nem sempre a melhor alternativa é terminar sumariamente a relação. A sociedade contemporânea, movida por interesses individuais, busca soluções mais fáceis e imediatas para resolver problemas pessoais, lembra a psicóloga. Ou seja, trocar de parceiro é mais viável do que investir em um relacionamento desgastado. “O problema é que essa solução mais fácil e imediata dura muito pouco. Portanto, logo terá que lidar com a realidade novamente”, argumenta. Às vezes, portanto, uma boa – e franca – conversa pode recolocar as coisas no lugar.
Rompimento
Outro caso, que também envolve o Facebook, aconteceu com uma estudante de medicina, Maria (nome fictício), e seu namorado. O casal fazia cursinho pré-vestibular junto e continuou unido, numa relação à distância, mesmo quando ele ingressou em uma universidade na capital e ela continuou em São José do Rio Preto (interior de SP).
A garota, apesar de saber a senha do namorado na rede social, não acessava o site, pois considerava a atitude “desagradável”. “Eu descobri a senha sozinha, por tentativa, mas não usava porque eu também não gostaria que ele entrasse no meu perfil.”
E, mais uma vez, o “inbox” foi o responsável pelo término. Após desconfiar de atitudes estranhas do garoto, Maria entrou no Facebook e descobriu que ele a traía com a prima de uma amiga – com o consentimento desta. “Foi horrível, eu fui traída em dose dupla: pelo namorado e pela amiga”, diz.
O rompimento do namoro, no entanto, foi de uma forma diferente: a jovem imprimiu todas as conversas que encontrou na rede e as entregou a ele, dentro de um envelope, como se fossem uma carta de amor. “Eu não tinha o que fazer e precisava jogar aquilo na cara dele de uma maneira que ele não iria esquecer.”
Geralmente, a traição pela internet acontece com pessoas entre 20 e 40 anos, no máximo, que utilizam as redes sociais com maior frequência. A procura por novas amizades e por antigos amigos na internet facilita o início de um diálogo amigável que pode gerar conversas mais íntimas – e passar a um relacionamento virtual sério.
Prova
A advogada e professora Fernanda Gurgel explica que, em casos de traição que envolvem a internet e chegam aos tribunais, o primeiro motivo a se levar em conta é se a prova apresentada é considerada lícita ou ilícita. “A prova ilícita não é permitida em processos, mas e o e-mail, e as redes sociais, o que são?”, questiona. E responde: “Hoje já se admite como meio de prova lícito, mas ela não é absoluta”.
O rastreamento de computador, por exemplo, viola o sigilo e a correspondência do parceiro. Logo, é ilícito. Para os advogados, recados individuais e e-mails não podem ser considerados prova de adultério. “A traição virtual não pode ser considerada adultério porque não é carnal”, diz Gurgel.
Gota d’água
E-mail e smartphones também não saem da lista de investigação. Se não há conta em redes sociais, o próximo passo é olhar a caixa de entrada dos torpedos e entrar na conta de correio eletrônico. Foi assim que Pedro descobriu que a garota com quem namorava mandava recados para o então colega Vitor (nomes fictícios).
A garota namorava Pedro há seis anos. O relacionamento, desgastado por causa do tempo, começou a gerar estresse e infelicidade na relação. Com isso, a falta de comprometimento foi levando a jovem a criar fortes laços de amizade com seu companheiro de trabalho Vitor.
Enquanto ela namorava Pedro, nas idas e vindas do namoro, a garota e Vitor conversavam por mensagens de celular. Apesar de serem torpedos de amizade, certo dia, em vez de enviar o recado para o “novo amor”, sem querer ela mandou a mensagem ao namorado, Pedro.
A desconfiança cresceu e Pedro começou a investigar os e-mails dela. “Esse é o típico caso em que um sempre faz questão de ter a senha de e-mail do outro, esperando por um tropeço a qualquer momento”, diz João, amigo de Pedro e primo de Vitor, que sempre esteve a par da situação.
As brigas entre o casal eram diárias, os passeios com os amigos diminuíam e o relacionamento com o colega de trabalho aumentava. Com isso, o desgaste do namoro levou à “perseguição” do e-mail cada vez mais intenso.
A gota d’água foi quando Pedro abriu um e-mail endereçado para Vitor com os dizeres: “Eu não sei mais o que fazer, eu sei que também mexi com você. Eu sei que você também tem uma namorada e que ela é intocável, mas eu não paro de pensar em você”, declarava a garota.
As provas eram concretas e Pedro terminou um namoro de seis anos. Hoje, a ex-namorada está com Vitor.