Literatura erótica desperta interesse feminino

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Livros que abordam sexualidade. Foto: Renata Fleischman

 

A trilogia “Cinquenta Tons de Cinza”, de Erika Leonard James, publicada no Brasil pela editora Intrínseca, repetiu no País o sucesso que viveu no exterior: mais de 200 mil exemplares dos livros foram vendidos em apenas três semanas, à época de seu lançamento nacional, em 2012. Aqui e no exterior, o êxito mundial na promoção do romance protagonizado por Anastasia Steele e Christian Grey deu margem à criatividade de escritores que pegaram carona à hora de produzir obras sobre sexualidade, sadomasoquismo e traumas psicológicos.

Tradicionalmente, a literatura pop se alimenta de determinados assuntos na hora de conquistar multidões e alçar ao sucesso autores até então desconhecidos. Foi o ocorrido, por exemplo, na série “Crepúsculo”, de Stephenie Meyer, que dominou as listas de mais vendidos a partir de 2005 e abordou diversos temas atrativos ao público jovem, como romance, aventura, paixão proibida e vampirismo.

Esses temas estão na base do interesse popular, de acordo com a psicóloga Michele Gouveia. “O indivíduo compra o livro porque se identifica com os personagens e projeta seus desejos neles”, afirma. “O ‘fenômeno Cinquenta Tons de Cinza’ desperta ainda mais atenção por abordar um tabu referente à sexualidade. Quando as pessoas não têm coragem para falar sobre o assunto, optam pela leitura”, argumenta.

Também psicóloga, Fatima Marinho argumenta que “Cinquenta tons de cinza” tem um apelo bem dirigido: o público feminino. Ao invés da identificação, a psicóloga propõe que o sucesso junto à leitora se deve, basicamente, à mobilização para a história. “As mulheres se envolvem com a protagonista, que, apesar de ser desastrada, insegura, é capaz de atrair e transformar um homem que aparentemente lhe é inacessível. Este homem a maltrata, a domina, mas ela enfrenta a dor e resiste a ela em nome do amor e da crença de que esse amor é capaz de transformá-lo. A temática é universal e muito antiga”, afirma. “Não acredito que sejam as cenas de sadomasoquismo ou a identificação das mulheres pela personagem que fizeram o livro ter tanto sucesso, mas sim o contexto em que elas estão inseridas”, complementa.

Liza Arnon Landshoff, de 49 anos, identifica, em livros como os de E. L. James, uma leitura fácil de compreender e destinada a mulheres de todas as faixas etárias. “Nos dias de hoje, as mulheres estão mais liberais, não têm medo de falar sobre a sexualidade nem esconder absolutamente nada. Acho muito bom alguns escritores escreverem sem reservas sobre sexo, assim os jovens ganham mais abertura para falar com seus pais e parceiros sobre o tema e podem se satisfazer plenamente.”

Liane Gotilib, de 47 anos, foi uma das que conferiram a trilogia a partir de sua repercussão – e tiveram uma boa surpresa. “As obras estavam aparecendo muito na mídia como best-sellers. É um tipo diferente de literatura, que desperta um lado erótico; achei interessante porque estimula a imaginação até de quem já é casado há muito tempo”, opina.

Apesar de ter alcançado o topo na lista de vendas, o “fenômeno Cinquenta Tons de Cinza” também recebeu diversas críticas. Para Paulo de Almeida, de 38 anos, leitor de sagas voltadas à fantasia como “O Festim dos Corvos”, de George R.R. Martin, a pornografia excessiva levou ao seu desinteresse pela obra. “Não consegui terminar a leitura”, diz.

Eliane Robert Moraes, em crítica assinada na Folha de S. Paulo, também critica as obras de E. L. James – segundo ela, basta ler os primeiros parágrafos para constatar a “baixa qualidade do texto”, que “só reitera valores sexuais contemporâneos e espelha os impasses amorosos e culturais da sociedade”. “Com hierarquias e regras das mais convencionais, o enredo chega a ser puritano e, não fossem as tais cenas de sexo, seria de perguntar qual a novidade que ele traz”, diz.

Renata Fleischman (1° semestre)