Como a taxação de livros pode afetar o mercado editorial brasileiro

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Pedro Guarache (3º semestre)

Em agosto de 2020, o ministro da economia Paulo Guedes defendeu sua proposta de reforma tributária e, também, aventou uma nova taxação de 12% em cima de livros. O assunto voltou a ser pauta em abril deste ano, quando a Receita Federal publicou um documento para sanar dúvidas sobre a reforma tributária. Segundo o documento, os livros podem ser taxados por não serem consumidos pelos brasileiros com renda de até dois salários mínimos. Com isso, o governo arrecada dinheiro, que pode ser encaminhado para políticas públicas destinadas aos mais pobres. Porém, uma série de outros fatores comprovam que pessoas de renda mais baixa leem livros, sim, e que a taxação apenas afetaria mais o mercado editorial brasileiro, que já se encontra em crise desde 2018.

Os livros são imunes a impostos no Brasil desde a Constituição de 1946, por iniciativa do, na época, escritor e deputado Jorge Amado (1912-2001). Além disso, eles se tornaram produtos isentos de algumas contribuições sociais em 2004. Praticamente todos os países na América Latina são isentos de tributação para livros, com exceção somente do Chile.

Luiz Schwarcz, editor e dono da editora Companhia das Letras, uma das maiores editoras do Brasil, disse em matéria para a Folha de S. Paulo que o público da Bienal do Livro do Rio de Janeiro mais recente, da qual participaram 600 mil pessoas, eram jovens da classe C em sua maioria. Já na Festa Literária das Periferias (Flup), 68% dos participantes pertencem às classes C, D e E.

Além da taxação afetar diretamente o consumidor que, segundo especialistas, pode aumentar em até 20% o valor unitário dos livros, a medida também afetará as editoras, tanto de pequeno, médio e grande porte. Alexandre Callari, editor e um dos donos da editora Pipoca & Nanquim, conta como a taxação afetaria o mercado a longo prazo: “Publicar livros no país é uma tarefa hercúlea e a adição desses impostos certamente levará diversas casas editoriais a fecharem as portas, pois tornará inviável a operação. Muitas vezes, a faixa de lucro de uma editora gira em torno de 15%, ou seja, praticamente a taxação proposta. O resultado é que isso será refletido no preço de capa dos livros e repassado para o consumidor final. Os livros vão ficar ainda mais caros e a procura vai cair. Além de isso diminuir o giro na economia, a consequência direta é que, com menos dinheiro circulando, as lojas também sentirão esse efeito num médio prazo. Logo, além de livrarias fechando, teremos lojistas fechando”, relata.

Eduardo Benzatti, antropólogo e professor da ESPM, explica como essa situação é vista pelo olhar da antropologia (ciência do homem): “Um dos aspectos mais importantes na formação do ser humano é o aspecto cultural. Cultura tanto no sentido amplo da palavra, civilização, como no sentido restrito, de aquisição do conhecimento. Os livros são um dos instrumentos mais importantes de transmissão da cultura. Taxá-los com mais impostos só os tornaria ainda mais um produto da elite, como diz o governo federal, logo, o que deveria ser pensado é exatamente o contrário. Retirar todos os impostos dos livros, torná-los mais acessíveis a todas as classes sociais, permitindo assim, que a cultura circule de uma forma mais ampla e democrática”.