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Edição 18 - Racismo Entrevistas Plural

“Não basta não ser racista, devemos ser antirracistas”

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Gabriela Soares e Giulia Pontes (4º semestre)

A luta antirracista não é nenhuma novidade. Mas, dadas as circunstâncias e mudança de gerações, o movimento ganha cada vez mais voz. A presença de celebridades e influenciadores do assunto para levantar a bandeira do combate ao racismo se torna referência no debate e engaja as novas gerações para reivindicar a discriminação racial, mesmo que veleda. Um exemplo é o ator, comediante, escritor e diretor Hélio de La Peña. Conhecido por seu trabalho, atuando no programa humoristico Casseta & Planeta, da Rede Globo por mais de 18 anos, sempre se destacou por ser um dos únicos negros em seu meio profissional.

Hélio conta que começou sua trajetória quando ainda cursava engenharia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), após ser um dos idealizadores da revista independente Casseta Popular e participar do programa TV Pirata, no qual percebeu sua vocação para o meio humorístico. Foi responsável pela roteirização e direção de seu programa, na maior emissora do Brasil, e logo se tornou uma personalidade de grande influência para diversos jovens negros, que sonhavam em conquistar o meio artistico, sempre liderado majoritariamente por brancos. Sua notoriedade se baseia na posição de destaque que marca seu currículo, não apenas ganhando espaço nas telinhas brasileiras, o ator e diretor preenche, também, a idealização e produção por trás das câmeras, trazendo consigo, um novo olhar à televisão.

“A discussão do racismo está aberta agora, mas quando eu era um artista preto da Globo, a minha presença por si só já representava uma situação atípica. Mas em situações nas quais eu não sou reconhecido, eu continuo sendo vítima de ataques racistas. Neste ano mesmo, eu estava abrindo um show para um amigo comediante, em um teatro dentro de um shopping. Quando fui buscar meu carro no estacionamento, o funcionário não me reconheceu e me barrou”, contou De La Peña, sobre situações de discriminação que sofre até os dias de hoje. Atualmente, sua trajetória se tornou grande inspiração e por isso ele aproveita seu espaço de destaque nas redes sociais para abordar questões importantes, como as cotas raciais, racismo estrutural e o caso de George Floyd. De La Peña, também, aproveita sua fama e rede de contatos para discutir pautas raciais com outros artistas e até especialistas negros.

Confira mais detalhes da entrevista exclusiva com o humorista, na qual ele revela sua relação com a luta antirracista em meio sua grande representatividade histórica no meio audiovisual e cultural.

Como foi sua jornada até chegar aonde você está hoje?

Tudo começou quando eu cursava Engenharia na UFRJ, e decidi junto de outros colegas desenvolver um jornal acadêmico de humor, o Casseta Popular. A revista foi ganhando fama, até que fomos convidados para trabalhar profissionalmente como humoristas na TV Pirata, no qual um produtor da Rede Globo percebeu que a produção tinha futuro no audiovisual e surgiu a ideia do programa Casseta & Planeta Urgente, que ficou ao ar de 1992 até 2012, sempre líder de audiência.

Você lembra da primeira vez que sofreu algum tipo de ataque racista ?

Uma situação que foi muito marcante pra mim foi quando eu estava apresentando o show Casseta & Planeta para o teatro na capital de São Paulo. Quando a apresentação terminou, eu estava na rua do lado de fora conversando com a mãe do meu colega e artista Beto Silva, quando fui abordado pelo segurança do local me acusando de ter roubado a bolsa dela. Quinze minutos antes eu estava em cima de um palco em um teatro lotado, mas quando saí na rua eu era só mais um negro sujeito a esse tipo de tratamento de ser sempre suspeito de alguma coisa.

Como você enxerga o racismo e a luta racial no Brasil?

Por toda minha vida, sempre fui a minoria. Eu era o único negro da minha sala na escola e essa situação percorreu até a vida adulta, e por isso sempre estive exposto a esse tipo de situação de discriminação. Esse assunto não era tocado por ninguém. Não era como agora, que existe essa discussão. Antigamente era debatida mais uma questão de diferenças de classe, a questão social estava muito mais em pauta do que a racial. Eu acho que a questão racial é mais presente hoje, não apenas por conta do episódio do George Floyd, mas também por conta do resultado bem sucedido das cotas raciais, que levou muitos negros para as universidades, o que gerou um centro de reflexão. As pessoas começaram a se identificar com o assunto, a se aproximar, conversar a respeito, forçar mais a barra.

Você já sofreu algum tipo de ataque racista mesmo depois de ganhar reconhecimento do público e fama ?

Depois que me tornei uma figura popular, me tornei menos alvo desse tipo de ataque, mas em situações nas quais eu não sou reconhecido, eu continuo sendo vítima de ataques racistas. Neste ano mesmo, eu estava abrindo um show para um amigo comediante, em um teatro dentro de um shopping no Rio de Janeiro. Quando fui buscar meu carro no estacionamento, o funcionário não me reconheceu e me barrou de entrar. Ele colocou a mão no meu peito e exigiu olhar o tíquete do carro, para provar que eu não estava tentando entrar para roubar. Foi o fim da picada. O cara ainda depois percebeu quem eu era e fiquei até com pena dele, de tanta vergonha que ele estava sentindo.

No auge da fama do programa Casseta & Planeta, como era a representatividade de ser um negro na maior emissora de televisão do Brasil ?

A discussão do racismo está aberta agora, mas, quando eu era um artista preto da Globo, a minha presença por si só já representava uma situação atípica. Eu nunca fiquei conhecido por papéis de ladrão, bêbado ou policial. Eu fazia parte do grupo de escritores e produtores, o que me dava mais autonomia para poder escolher representar o que eu quiser, e essa situação era totalmente privilegiada. Dessa forma, vários comediantes negros viram em mim a possibilidade de seguir essa carreira, sem medo de não ter liberdade para ser o que quiser. Acredito que essa nova geração de negros artistas me veja como uma referência.

Qual a importância de debater e levantar a luta antirracista na mídia, já era presente desde o ínicio da sua carreira ?

Eu diria que hoje em dia falo muito mais sobre o assunto do que em toda a trajetória do Casseta, porque minha influência se dá pelo fato de ser eu, estar ali já era completamente inédito na história da TV. A sociedade está avançando, dando passos à frente. O ativista está sempre falando daquilo, acaba sendo chato mas é um chato necessário, para colocar aquilo em discussão.

Como você vê a importância de escalar negros em papéis de destaque na mídia?

Na população brasileira, mais de 50% se declara negra. Mas não tem esse mesmo número de marginais, bandidos e traficantes, ou seja, tem negros ocupando diversas funções na sociedade. Porque então você restringe um negro a papéis como policial, bandido e traficante. Estava no ar até há pouco tempo, na novela Totalmente Demais, da Rede Globo, fazendo um papel de advogado. Uma situação diferente na televisão, que não deveria ser diferente. Chegando novembro, a quantidade de propagandas, revistas e jornais que acrescentam a figura de uma pessoa negra. Acabando o período da consciência negra, volta tudo ao normal. A representatividade é muito baixa e isso sempre foi tratado de uma forma normal. Hoje, por conta de toda essa discussão acontecendo, algumas pessoas têm prestado mais atenção. Estamos no Brasil, um país com a maioria negra, mas não os vemos porque estão sempre em uma situação inferiorizada, decaída. As artes acabam refletindo o que é sociedade, espero que a transformação se dê na sociedade, e assim, refletirá na arte. Estão impondo à arte um papel de vanguarda, desta mostrar algo que na verdade não está acontecendo. É isso que chamamos de racismo estrutural, situações não tão perceptíveis, é a bolha em que as pessoas vivem.

Existe desigualdade racial velada em forma de piada dentro do meio humorístico? Qual sua opinião do “politicamente correto” dentro do meio humorístico?

O meio dos humoristas tem muito mais liberdade e noção de interpretação de texto, diferentemente de estar em uma rede social aberta ao público. Uma coisa é o público e outra os profissionais. Nós profissionais nos zoamos, o stand-up mesmo é baseado em uma coisa de você se autossacanear, temos uma liberdade e uma tolerância maior. Mas ainda existem pessoas que fazem piadas inconvenientes. No entanto, no meio humorístico não vejo tanto problema quanto eu vejo na sociedade de uma maneira geral. Eu acho inclusive que esse tipo de piada preconceituosa vem perdendo espaço, não só por pressão, mas as pessoas não acham mais graça. Ainda têm alguns nichos em que pessoas riem dessas piadas de “tiozão”, mas já alcançaram sua validade. A piada que ninguém ri o humorista deixa de fazer.

Qual é o papel do artista, de usar sua influência e alcance de público, para falar sobre o racismo ?

É importante você ter figuras de referência para trazer essa discussão, até pela falta de contato com as pessoas negras em seu convívio. Hoje em dia, tem a imagem do racista como supremacista branco da Ku Klux Klan, às vezes você não se considera racista mas a sociedade te coloca em situações e ali você acaba sendo racista em coisas do seu dia a dia. A pessoa não percebe situações culturalmente enraizadas e se você comenta, a pessoa se sente até mesmo ofendida. As pessoas têm que entender a questão do racismo estrutural e sua presença em toda a sociedade, ouça e aprenda com isso. Se questione sobre as pequenas coisas, esse é o princípio para mudar a sociedade. A piada que sacaneia o branco no palco não é racismo inverso, porque essa piada não tira o emprego de ninguém, não barra e nem impede nada. O racismo acontece quando a polícia invariavelmente me para na rua sem eu ter feito nada, quando eu entro em um prédio e sou mandado para a entrada de serviço, quando em uma entrevista de emprego, as oportunidades são menores para os negros simplesmente por sua aparência, por sua cor. O racismo inverso não existe, porque essas coisas não acontecem com brancos e o crescismento da luta antirracista não tem nenhuma relação com isso. Não basta não ser racista, devemos ser antirracistas, devemos escutar o que aquela pessoa tem a dizer. Neutralizar é anular aquele comentário e mantém as coisas como elas são. As coisas têm que mudar agora.

Você tem algum projeto para o futuro que aborda o assunto?

Em novembro lancei um filme chamado Correndo Atrás, esse filme é baseado em um livro que eu lancei há um tempo chamado Vai na bola do Anderson, é uma comédia mas tem a ver com a questão racial. Não por levantar a bandeira antirracista, mas por ter um elenco, comando, direção majoritariamente negra. Temos que passar desta etapa, que é importante porém insuficiente, de só ter negro na televisão quando o assunto é racismo. Eu acho que esse filme que estou lançando aponta para esse lado, e ele só foi possível porque tinha pretos no comando. Montamos uma equipe de pessoas talentosas e negras. Para dar espaço para essa mudança e furar essa bolha você precisa de pessoas negras em posições-chave para a sociedade, nas camadas superiores da sociedade para também incluir e dar espaço para mais pessoas pretas como um todo.

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