Seguir a seleção brasileira perdeu a graça? Jornalista e torcedores comentam
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Arthur Sapiro (1º semestre)
“Eu sou brasileiro com muito orgulho e muito amor”. Um canto tantas vezes ecoado pelo povo brasileiro em época de Copa do Mundo parece ter perdido seu valor. Hoje, é normal encontrar brasileiros que optam por torcer até mesmo para outras seleções, e isto ficou evidente na final da última Copa América, em que diversos brasileiros comemoraram a vitória da Argentina contra o Brasil, em pleno Maracanã, no dia 10 de julho. Em Novembro de 2020, o jogo entre Brasil e Uruguai, pelas eliminatórias da Copa do Mundo de 2022, sequer foi transmitido pela televisão aberta. Estes dois acontecimentos expuseram a queda de popularidade que a maior seleção do mundo vem enfrentando.
Para Luiz Gustavo Amorim, 57, há uma escassez de maturidade e técnica no plantel: “A Copa de 2006 foi a minha inflexão. De lá para cá, minha relação com a seleção só piora. São várias as razões. No meu caso, desde 2006, não só não encontro jogadores com a mágica anterior, como também tem havido uma profunda infantilização de boa parte dos jogadores, frágeis emocionalmente e cada vez mais preocupados com frivolidades. O Neymar é a epítome dessa geração da profissionalização precoce e mimada. Não me sinto mais representado, não sinto mais orgulho. A seleção antes era composta quase sempre por sujeitos que na grande maioria pareciam adultos responsáveis e muito ciosos do que representava aquela mística”.
“Meu auge de envolvimento com o time brasileiro foi na copa de 82, porque era o auge do Flamengo. Eu torcia muito pelo time e principalmente por jogadores como Zico, Júnior, Leandro e vários outros que podiam ter ido pra seleção também. Então, essa devoção ao clube e, principalmente, aos jogadores era transportada para seleção”, afirmou Ricardo Sapiro, 50, para quem as pessoas em geral não conseguem se identificar mais com uma equipe cuja maioria dos jogadores convocados atua na europa desde muito cedo e não cria um laço afetivo com os brasileiros, exceção, segundo ele, a Neymar.
Uma pesquisa desenvolvida pelo instituto Datafolha revelou que a torcida da seleção brasileira é majoritariamente (36%) composta por adultos entre 45 e 59 anos. Já os jovens entre 16 e 24 foram a minoria com apenas 3%.
No período pós-conquista da Copa América de 2019 e antes da chegada do novo coronavírus (que resultou na proibição de público nos estádios), a seleção brasileira realizou seis partidas amistosas, nenhuma em solo nacional.
Além disso, quando ocorrem jogos no país, os preços dos ingressos são fora da realidade para grande parte dos brasileiros. Na Copa América, com a ressalva de ingressos de R$ 60 para os setores sem cadeiras em estádios como a Neo Química Arena e Arena do Grêmio, o ingresso mais barato custava R$ 120 e o mais caro custava R$ 890. Em 2019, o salário mínimo era de R$ 998 (89,17% do ingresso mais caro).
Para o jornalista esportivo Arnaldo Ribeiro, existe ainda uma terceira possível explicação para a falta de interesse pela seleção: a quantidade excessiva de jogos. Para ele, o alto número de partidas banaliza a própria seleção e diminui a atração das pessoas.
Arnaldo também comentou sobre o atual momento que o Brasil vem enfrentando: “há um desgaste geral da imagem do país, inclusive de símbolos como a camisa da seleção brasileira e a bandeira. Tem um entorno grande que não percebemos mas que acaba atingindo questões esportivas como a seleção, e isso sempre teve algum contexto político na história, a favor ou contra a seleção brasileira, em situações bem peculiares”.
Os horários dos jogos também prejudicam. Marcos Diniz, 60, acredita que os horários são incompatíveis com a rotina dos brasileiros, e acaba diminuindo a audiência das partidas. “Em 2019, teve amistoso às 14h de uma terça-feira. Quem vai assistir? O fato da seleção jogar longe em horários que não têm absolutamente nada a ver com os brasileiros é um fator que gera o distanciamento do torcedor”.
Possível solução
Para os torcedores entrevistados, pode haver uma luz no fim do túnel. “A CBF precisa trazer seus amistosos para o Brasil, encher os estádios e medir forças com seleções fortes para chegar bem preparado para a Copa do Mundo e fortalecer a conexão entre o time e o país”, sugere Marcos Diniz.
Já o jornalista Arnaldo Ribeiro aposta na redução da quantidade de jogos: “quando tiver o jogo da seleção, não pode ter concorrência interna. E os momentos de seleção poderiam ser menos momentos e mais sagrados para adquirir aquela expectativa de jogo”.