Uso diário da bicicleta ainda é desafio na rotina de São Paulo

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Apesar de ostentar 241,4 km de malha cicloviária, segundo a Companhia de Engenharia e Tráfico de São Paulo (CET-SP), a cidade de São Paulo ainda enfrenta dificuldades para disseminar o uso de bicicletas como meio de transporte permanente da população. Por ainda ter uma estrutura muito focada no trânsito de automóveis, faltam conexões entre ciclovias extensas e itens infraestruturais que forneçam segurança permanente aos ciclistas.

Espaço para todos: bicicletas e automóveis na Avenida Paulista na manhã do último dia 17. (Foto: Maria Eugênia Ferber)

Coordenador do movimento Bike Anjo, que tem como objetivo inserir a cultura do uso de bicicletas nas cidades de maneira segura, Marcos Bueno acredita que a falta de estrutura atrapalha o crescimento do número de ciclistas urbanos, já que a maioria não possui nenhuma informação de como utilizar a bicicleta como meio de transporte. “Por parte do governo e dos órgãos públicos, não vejo nenhum incentivo; são as ONGs, movimentos e coletivos voltados à mobilidade urbana e ao meio ambiente que se desdobram para inserir a bicicleta no dia-a-dia da população”, acrescenta.

Para Roberto Arneiro, empresário que usa a bike para seus compromissos pessoais e profissionais sempre que possível, a adoção deste hábito traz uma série de vantagens. “Além de ser um veículo não poluidor, melhora o condicionamento físico e promove a sociabilidade. Outro diferencial que a bicicleta oferece é a condição de o usuário poder parar praticamente dentro do estabelecimento de destino, o que não é possível com veículos motorizados”, alega.

Um bom exemplo de como transformar a bicicleta em meio de transporte cotidiano está na Holanda, que dedica atenção especial ao tema em sua política de transportes. Hoje, o país ostenta mais de  29.000 quilômetros de ciclovias, por onde circulam 18 milhões de bicicletas. O investimento ganhou força após a primeira crise do petróleo, na década de 1970, e também foi motivado pelo alto volume de acidentes com ciclistas e pedestres.

A grande vantagem da existência de ciclofaixas, ciclovias e ciclorrotas é o acesso exclusivo para bicicletas, além de ser uma alternativa de lazer ao ar livre aliada à prática esportiva, oferecendo economia e mobilidade. A Avenida Paulista, no centro de São Paulo, abriga uma ciclofaixa de lazer, a última a ter sido inaugurada na cidade, com 5 quilômetros de extensão. Essa nova rota, aberta em dias específicos, serve principalmente de incentivo ao uso da bicicleta como meio de lazer, sem benefícios diretos a quem pretende tê-la como meio de transporte cotidiano.

Na opinião de Marcos Bueno, as ciclofaixas não estimulam o uso permanente desse meio de transporte. “Mas ela tem seu lado positivo, pois coloca o motorista da semana como ciclista nos finais de semana, e esse começa a ver como é pedalar pela cidade, tanto como benefício quanto no seu uso diário”, afirma.

Termo muito usado pelos especialistas em transporte, mobilidade  não significa apenas a melhoria estrutural dos sistemas de transporte. Há, no conceito, a ideia de minimizar os impactos sociais e ambientais causados para a cidade – incluindo poluição do ar, estresse e insegurança pública –, que afetam a qualidade de vida. Segundo Bueno, o ciclista urbano atua, nas grandes cidades, como parte da solução para a mobilidade e, também, como um incentivo à humanização do espaço público. “A bicicleta não é a solução para a mobilidade em São Paulo, mas é uma grande parte da solução.”

Segurança – O uso das ciclovias e ciclofaixas também está ligado, em muitos casos, à exposição dos adeptos à violência no trânsito, tema também crítico nas discussões sobre mobilidade urbana. No Código de Trânsito Brasileiro, são descritas as atribuições, direitos e deveres de quem recorre a este meio de transporte.

No domingo (10), um ciclista perdeu um braço após envolver-se em um acidente com um veículo na Avenida Paulista, por volta das 5h. O motorista fugiu sem prestar socorro, mas se apresentou espontaneamente à polícia algumas horas depois. O ciclista, David Santos Souza, de 21 anos, disse em depoimento à polícia que pedalava na contramão, mas dentro das delimitações da ciclofaixa. Apesar de ainda não estar ativa naquele horário, a via pareceu segura para o jovem, pois já estava separada do trânsito de veículos. Uma testemunha afirmou que o atropelador invadiu a ciclofaixa em alta velocidade.

Casos como esse sinalizam alguns riscos que o ciclista corre; no entanto, não são capazes de diminuir a frequentação dos espaços. O comerciante Fernando Ortiz, que usava a ciclofaixa da Avenida Paulista pela primeira vez uma semana após o acidente, considerou o ocorrido com David uma “fatalidade”, e confirmou que ainda vale a pena recorrer à bike. Frequentadora assídua, a arquiteta e professora Izabel Meister também argumentou que o acidente ocorrido deve “servir como aprendizado”.

Maria Eugênia Ferber (1º semestre)