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1968 - 50 anos depois Edição 12 - 1968, 50 anos depois Plural

Festivais culturais nos anos 1960 mudaram a MPB

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Por Catarina Bruggemann
»»»Na década de 1960, o Brasil viveu eventos que mudaram drasticamente a direção da música popular brasileira, revelando compositores que
moldaram a cara do que hoje conhecemos como MPB. Foram os festivais de canção que popularizaram e consolidaram figuras como Caetano Veloso,
Chico Buarque, Edu Lobo, Geraldo Vandré, Elis Regina, Nara Leão, Jair Rodrigues, entre outros. O próprio conceito de Música Popular Brasileira
(MPB) surge e se firma nesse contexto, em uma espécie de brincadeira com a sigla MDB, já que os artistas viam na música, assim como na política, uma oposição ao partido Arena e à própria ditadura militar.
A forma do festival era muito característica: um show em um auditório, com plateia, transmissão para outras emissoras ao redor do Brasil, jurados que avaliavam e selecionavam as canções que eram inscritas pelos compositores, e um corpo de cantores contratados pelas emissoras para interpretar essas músicas.
Quem iniciou o evento no Brasil foi o produtor musical Solano Ribeiro, que em 1965 trabalhava na TV Excelsior, coordenando sua programação. Zuza Homem de Mello, escritor, jornalista e produtor musical, conta em seu livro “Era dos Festivais: Uma Parábola”, que a TV Excelsior percebeu que os grandes intervalos na programação das demais emissoras saturavam o público, então passou a veicular apenas três minutos de anúncio.
“Valorizando os artistas brasileiros, inclusive com vinhetas exclusivamente de música nacional, em menos de seis meses a Excelsior já era considerada líder”, escreve Zuza. O feito gerou ao canal uma receita que permitia que pagasse salários desproporcionais aos valores do mercado.
Com esses recursos, foi realizado o primeiro Festival da Música Popular Brasileira, em que 36 músicas concorreram ao prêmio de melhor canção. O júri daquele ano era formado pelos grandes nomes da poesia concreta Augusto de Campos e Décio Pignatari, pelo compositor e arranjador Damiano Cozzella, e pelo pianista Amilton Godói. O evento revelou os cantores Elis Regina e Jair Rodrigues, que interpretaram a música vencedora do primeiro lugar daquele ano: “Arrastão”, uma composição de Edu Lobo e Vinicius de Moraes. O segundo lugar ficou com “Valsa do Amor que Não Vem”, composição da recém-formada aliança entre Vinicius de Moraes e Baden Powell, interpretada por Elizeth Cardoso.
Sucesso
O evento foi um sucesso absoluto, e a Excelsior abriu dianteira sobre a concorrente TV Record. Em reação, a vice-líder de audiência se movimentou para retomar o posto perdido contratando a estrela descoberta no Festival: Elis Regina.
A cantora, dirigida pelo bailarino e coreógrafo Lennie Dale, com seus movimentos expansivos, com braços que lembravam hélices, foi completamente contra a tendência intimista pautada pela bossa nova. “Sem saber direito o que fazer com a artista que eles acabaram de contratar, pensaram em um programa que já tinha dado certo no teatro Paramount: Elis Regina, Jair Rodrigues, e um trio”, conta Zuza. Assim nasceu “O Fino da Bossa”, programa gravado em um auditório, com público pagante.
O programa também foi um sucesso de audiência e ampliou a programação musical da Record. Como “O Fino da Bossa” capturava um público mais jovem, foi lançado o “Bossaudade”, que tinha os mesmos moldes, mas era apresentado por Elizeth Cardoso. Além disso, surgiu uma demanda para um público ainda mais jovem, os adolescentes que estavam tomados pelo fenômeno pop daquele momento: os Beatles.
Iê-iê-iê
O programa de domingo era o “Jovem Guarda”, representando a expressão brasileira do rock de grupos como os Beach Boys, Beatles e Rolling Stones. Era apresentado por Roberto Carlos (o Brasa), Erasmo Carlos (Tremendão), Wanderléa (Ternurinha), Wanderley Cardoso (Bom Rapaz) e Martinha (Queijinho de Minas). O grupo recebia convidados como Ronnie Von, Eduardo Araújo, Sérgio Reis, Leno e Lilian, The Fevers, entre outros artistas que seguiam esse estilo de composição.
O pesquisador musical Dilmar Miranda diz em seu livro “Nós, a Música Popular Brasileira” que “adeptos do iê-iê-iê traziam para o interior do país e da nossa música popular uma nova temática, que passa a povoar o imaginário fantasioso da juventude, com carrões, garotas, festas de arromba, conflito de gerações etc., com melodias, harmonias, rítmicas e instrumentos como a guitarra elétrica, totalmente estranhos à tradição da cultura musical brasileira”.
O programa era exibido ao vivo para São Paulo e retransmitido alguns dias depois para as demais cidades brasileiras. Todos esses programas foram ao ar em 1965, como u ma resposta da TV Record ao sucesso do festival, e em 1966 a emissora já era novamente líder de audiência.
Nesse momento, a Excelsior dispensa Solano Ribeiro, “pai” do primeiro Festival na TV, que então procura a direção da Record e sugere que esta realize uma nova edição do evento de 1965. A partir disso, o Festival da Música Brasileira passa a ser realizado pela TV Record.
“A Record teve na mão o maior elenco de compositores da história da música brasileira. Toda noite lotava de gente para assistir os programas, então nada mais natural que fazer um festival. Aí surge o Festival de 1966”, relembra o jornalista e produtor Zuza Homem de Mello.
Novos astros
Em 1966 as duas primeiras colocadas da disputa foram “A Banda”, de Chico Buarque, cantada por Chico e Nara Leão, e “Disparada”, de Geraldo Vandré e Teo de Barros, cantada por Jair Rodrigues, Trio Maraiá e Trio Novo. Literalmente foram duas vencedoras, pois, apesar de nas enquetes “A Banda” ter mais que o dobro de votos de “Disparada”, no momento final houve uma imensa polarização entre as duas músicas, então por uma sugestão (e pressão) de Chico, os jurados premiaram ambas as canções.
No livro “Histórias de Canções – Chico Buarque”, Wagner Homem revela o que fez com que os jurados tomassem tal decisão: “O que gerava tensão nos organizadores era a ameaça que acompanhava a inusitada proposta: ele se recusaria publicamente a receber o prêmio sozinho. Uma festa como aquela, transmitida pela TV, não podia terminar em confusão”. E complementa: “O resultado da votação (sete a cinco em favor de A Banda) foi mantido em sigilo por quase quatro décadas”.
O ex-diretor da Record Paulinho Machado de Carvalho conta no documentário “Uma Noite em 1967” que os festivais eram organizados como um
espetáculo de luta livre, “com um mocinho, um vilão…” para despertar o interesse do público, e Chico Buarque era o grande mocinho. Se os espectadores soubessem que a emissora forçou a mão para dividir seu prêmio com outro, seria um escândalo.
Chico foi uma exceção: não era comum que os compositores apresentassem as próprias canções, afinal, a Record tinha um grande elenco que interpretava as músicas. No entanto, os compositores começaram a ficar descontentes com isso, pois o público acabava não associando o compositor às músicas, e os intérpretes levavam toda a fama. Do festival de 1966 para o de 1967, aconteceu uma mudança substancial nesse sentido. Os compositores se tornaram intérpretes de suas próprias músicas.
“Uma noite em 1967”
Pairando acima de toda a efervescência daquele momento, existia a ditadura – e a censura. Essa situação política deu à música daquele momento um direcionamento lírico engajado com questões sociais e de protesto contra o regime ditatorial.
Zuza fala sobre as expectativas do público em torno das músicas. “Havia uma tendência de que, nas entrelinhas, toda canção deveria ter um conteúdo
contrário à ditadura militar.” E lembra do caráter de “torcida organizada” do público, que vaiava o adversário. “As músicas que não tinham conteúdo político eram vaiadas, independentemente de quem fosse o compositor.”
No III Festival da Música Popular Brasileira, o cantor e compositor Sérgio Ricardo recebeu uma grande vaia simplesmente por ter mudado o arranjo da canção. Não conseguiu cantar sua música “Beto Bom de Bola” até o final. O cantor perdeu o controle, quebrou seu violão e o atirou ao público. Foi desclassificado.
Caetano Veloso se apresentou ao lado do grupo da Jovem Guarda Beat Boys com a polêmica “Alegria, Alegria”. Segundo Miranda, usou “procedimentos narrativos e musicais estranhos à tradição da MPB”. “A canção descreve problemas sociais e políticos, nacionais/internacionais, misturando-os ao dia a dia vivenciado por jovens de classe média.”
Ela foi veementemente criticada por uma grande parcela dos artistas, que rejeitavam a ideia de usar guitarras elétricas na MPB, da mesma forma que criticava as referências implícitas a aquela cultura pop que vigorava fora do país e que era vista como símbolo de opressão.
Por exemplo, a citação a Brigitte Bardot e, conforme revela Miranda, “a alusão ao uso de alucinógenos, camuflada no diagrama do verso sem Lenço e Sem Documento (LSD), inspirado na canção Lucy in the Sky with Diamonds, dos Beatles”.
A música de Gilberto Gil “Domingo no Parque” trazia referências eruditas mescladas ao baião e à capoeira nordestina, e foi apresentada ao lado do conjunto de rock Os Mutantes. Ela, assim como “Alegria, Alegria”, sinalizava a antropofagia tropicalista que se consolidaria em 1968. As duas ficaram respectivamente em segundo e quarto lugar naquele ano.
As canções “Ponteio”, de Edu Lobo e José Carlos Capinan, e “Roda-Viva”, de Chico Buarque, ficaram respectivamente em primeiro e terceiro lugar e eram mais afeitas aos moldes que se estabeleceram na MPB dos festivais.

Gilberto Gil se apresenta com Os Mutantes | Foto: Reprodução
“1968 – O Ano que não Terminou”
Por conta do imenso sucesso do festival de 1967, que foi considerado o mais marcante da TV Record, o ano de 1968 viu uma multiplicação de festivais no Brasil inteiro. “Se deu festival adoidado”, afirma Zuza. A própria Record realizou dois festivais naquele ano, o Festival da Música Popular Brasileira, que já vinha acontecendo desde 1966, e um especial de sambistas cariocas. O ano foi marcado ainda por composições fortemente contrárias à ditadura militar.
Além disso, estava se consolidando efetivamente a Tropicália, um movimento “neo-antropofágico” liderado por Caetano Veloso e Gilberto Gil, que ao lado de Maria Bethânia e Gal Costa eram os “Doces Bárbaros”, contando com a participação de Os Mutantes, e de Tom Zé.
A questão antropofágica foi um resgate da proposta modernista de Oswald de Andrade de utilizar elementos externos integrados à cultura nacional. No caso do Tropicalismo, integrados à música. O Festival de 1967 já havia sido uma amostra disso, com a integração das guitarras elétricas, o grande símbolo do rock, a músicas com ritmos brasileiros.
Em 1968, o festival mais marcante não foi o da Record, mas sim o Festival Internacional da Canção Popular (FIC), da TV Globo, de que participavam músicas nacionais e estrangeiras. Nele, se mantinha a regra da vaia contra músicas sem conteúdo político explícito. Dois eventos repercutiram por esse mesmo motivo.
Um deles foi a discussão entre Caetano Veloso e o público que o vaiava durante a interpretação de “É Proibido Proibir”, em que ele criticou agressivamente a rejeição do público à estética experimental da canção com frases como “é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder? Vocês estão querendo policiar a música brasileira. Se vocês, em política, forem como são em estética, estamos feitos”, entre outras.
Assim como aconteceu com Sergio Ricardo no ano anterior, a canção foi desclassificada do festival. “O público estava agindo como um exército, qualquer música sem conteúdo político era vaiada, ninguém pensava mais”, avalia Zuza.
Outro evento marcante foi a decepção do público quando a música tida como favorita naquele ano, “Pra Não Dizer que Não Falei das Flores”, composta e interpretada por Geraldo Vandré, com crítica explícita à ditadura, não venceu. O maestro e doutor em comunicação social Kléber Mazziero de Souza explica a colocação. “É uma canção bastante pobre do ponto de vista musical, e, apesar da mensagem contundente, também pobre poeticamente”. A música vencedora, “Sabiá”, de Chico Buarque e Tom Jobim, também tinha um forte conteúdo político, mas velado, de maneira que não despertasse a atenção do regime, mas não foi compreendida pelo público naquele momento.
A revolta despertou a atenção dos militares para aqueles grandes eventos. “Os militares achavam aquilo tudo uma coisa boba, sem relevância, até quando eles começaram a perceber que não era bem assim”, comenta Zuza.

Apresentação de Caetano Veloso em festival de MPB | Foto: Reprodução
O fim dos festivais
O FIC aconteceu em outubro, e em dezembro foi decretado o AI-5. Com isso, grande parte dos compositores foram exilados. Caetano e Gil foram para Inglaterra, Chico Buarque foi para a Itália, Geraldo Vandré foi preso. Conforme comenta Mazziero, “o problema não era só que eles estavam longe, era também que os discos não chegavam mais aqui”. Além disso, dentro do Brasil a censura ficou muito mais rígida, prejudicando inclusive aqueles que permaneceram no país, como Milton Nascimento.
Para o regente, esse grande vácuo foi preenchido por Elis Regina, que, embora não fosse compositora, sabia garimpar canções para interpretar. Assim se popularizaram compositores mais jovens, como Milton Nascimento, João Bosco, Ivan Lins, Belchior, entre outros.
Por conta desse vazio, os festivais gradualmente esmaeceram. Em 1972 aconteceu o último FIC com estrutura de programa televisivo. Existem até hoje competições do tipo, mas não têm audiência como na década de 1960.
Zuza e Mazziero comparam aquele momento com a atualidade e concluem que houve uma inversão de valores da indústria musical, que em um primeiro momento procurava bons compositores para torná-los famosos e hoje procura astros sem se preocupar com sua qualidade, favorecendo programas como “X-Factor”, ou o “The Voice”, que priorizam a interpretação.

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