As mudanças que as crianças provocam numa tarde de trabalho voluntário

Quinta-feira, 17 de outubro de 2013. Os alunos da Escola Graduada de São Paulo, localizada no Morumbi, zona sul de São Paulo, foram para o Cáritas Santa Suzana em espirito de comemoração pelo Dia das Crianças. A instituição foi criada por duas irmãs religiosas com a motivação de tirar das ruas as crianças de Paraisópolis, uma das maiores favelas da cidade. Os estudantes que frequentam o Cáritas têm a opção de atender a esta instituição durante o período da tarde ou da manha, dependendo de seu horário escolar.

Bianca Paulino (1º semestre)

Quando chegamos lá, as crianças nos receberam de braços abertos e com o maior sorriso na boca porque “os tios” finalmente chegaram. Grupos de seis crianças para cada dois alunos (monitores) da escola americana foram formados. Cada grupo praticava workshops diferentes, variando de arco e flecha e futebol a aulas de inglês e cozinha.

“O que você está fazendo, tia?” – disse a menina de cachos e um olhar angelical.

Respondi que estava escrevendo uma matéria, porém fazendo minhas anotações em inglês, porque é a minha língua-mãe.

Interessadas naquela língua diferente pediram para lhes ensinar. Comecei a conversar com elas perguntando o básico: what´s your name?

– Mirella, mas pode me chamar de Mi, disse a baixinha de cachos.

-And I am Bianca, gritou a outra menininha.

-Que coincidência, interrompi, meu nome também é Bianca.

-Não, você é a “tia” Bianca.

A partir de então essas duas meninas seguraram a minha mão e não soltaram mais até a hora de cozinhar biscoitos (as crianças da instituição cozinham biscoitos para os seus benfeitores como agradecimento).

No workshop de cozinha, foram os meninos que se aproximaram, querendo saber mais sobre meu parceiro e eu. Contaram depois que eles frequentam o Cáritas todos os dias à tarde. Um dos meninos continuou a falar, alegando que sua mãe trabalha como “limpadora de casa e só volta no final de semana”.

-Mas só sexta? Por que tanto tempo longe de vocês?—perguntou Alex, meu parceiro.

-Por que ela precisa ganhar dinheiro e quando eu pedi pra ajudar, ela disse que era melhor que eu fosse para a escola, e por isso estou aqui — lamentou o menininho de cabelos lisos pretos.

-Mas quantos anos você tem?

-Seis.

-E você mora com seus irmãos?, disse eu, com a esperança de ouvir algo como “moro com meus irmãos e eles cuidam de mim”.

-Não, moro sozinho. Mas eu sei usar um micro-ondas.

Sem saber o que dizer e sem querer entrar muito no assunto para não aborrecê-lo, tomei sua mão e o reafirmei que sua mãe estava fazendo isso por que ela o ama.

-Eu sei. Mas eu sinto falta dela. Mas hoje não mais, porque vocês todos estão aqui, disse o menino com um sorriso no rosto.

Fiquei com o coração partido, não ia conseguir ver a carinha do menino quando fosse a hora de entrar naquele ônibus e retornar.

Na hora de distribuir os presentes, todas as crianças correram pra receber os seus, menos o menininho de cabelos lisos. Ele ficou ao meu lado, segurando a minha mão.

-Você não quer ganhar um presente?, perguntei .

-Não, meu presente é você. Eu tenho uma mãe nesta quinta feira, respondeu o garoto que abraçou bem forte a minha perna.

Já vi em vários lugares e filmes situações onde uma pessoa se emociona com o que está acontecendo. Mas nunca pude entender, porque isso nunca tinha acontecido comigo.

Eu estava querendo adiar o momento de despedida. Não ia conseguir me segurar emocionalmente ao ver a cara do menino, mas, infelizmente, tudo tem fim.

Na hora que estava entrando no ônibus, fui abraçar o menino que perguntou:

-Amanhã você vai estar aqui de novo?

Segurei-me. Tentei procurar algo de importância minha para dar ao menino. Encontrei somente meu elástico de cabelo. Tirei do meu pulso e coloquei no dele.

-Quando a segunda-feira chegar e for a hora da sua mamãe partir, segura meu elástico com muita força e lembre-se que você também é forte.

E ele realmente é, porque me deu um abraço e partiu retornando à multidão que encontrava sua verdadeira família, seus amigos.