DAPHNE RUIVO
»»»Dia 1º de março, 14h, sala de reunião. 19 pessoas sentadas em frente a telas de computador. Nervosismo e curiosidade definem o estado de espírito de cada estudante. Em pleno terceiro semestre foi proposta a elaboração de uma revista. Todos aceitaram o desafio sem saber exatamente o que os aguardava. A única certeza: haveria muito trabalho pela frente.
Já no início os alunos se dividiram em grupos para os encontros semanais. Com o tema da revista definido, pautas foram sendo debatidas e a ansiedade ia crescendo com a aproximação de nossos deadlines – o jargão jornalístico para um prazo final de entrega dos trabalhos, inadiável. Durante dois meses e alguns dias exploramos as ruas de São Paulo e suas peculiaridades. Desafios, portas na cara e vários “nãos”, na maioria das vezes, foi o que encontramos. A palavra que definiu esse período é persistência.
Não é fácil para um jovem de 19 anos chegar em casas noturnas pedindo para entrevistar funcionários do local. Ou sair com uma máquina fotográfica enorme pendurada no pescoço durante a madrugada da rua Augusta. Ou ainda andar por ruas desconhecidas, sentar e conversar com estranhos, pedir informações pessoais e conseguir que os entrevistados os levassem a sério (experimente conduzir entrevistas em meio a baladas ou na madrugada de teatros, hospitais e outros locais).
Desistências e contratempos
De 13 pautas que inicialmente planejamos para esta edição, duas caíram. De início pensamos em uma reportagem sobre o que acontece nas madrugadas dos aeroportos e do metrô, mas os empecilhos foram tantos que não conseguimos coletar informação suficiente (checada e confiável) e desistimos do plano.
A outra pauta foi derrubada por decisão própria. Queríamos entrevistar “o” empresário da noite paulistana, algum figurão dono de dezenas de bares e casas noturnas que nos desse um panorama vibrante da cena boêmia na capital. Pesquisamos diversos candidatos, mas ao fim ponderamos que, do ponto de vista do interesse público, que é o que precisa nortear a nós, futuros jornalistas, em nossas pautas, não haveria muito apelo em desfilar cifras de um empresário em uma revista como a Plural, voltada a temas sociais. Optamos por um psicanalista, e o resultado compensou o risco de abandonar a outra pauta no meio.
Os contratempos não pararam por aí. “Olá, sou repórter da revista Plural e gostaria de fazer uma entrevista com o senhor.” Essa foi a frase que mais saiu da boca dos alunos. Receber um “não” era duro, mas receber um “sim” tempos depois era revigorante e parecia compensar tudo.
Daniel Rybak, 21 anos, sentiu as dificuldades de um foca (como os jornalistas chamam os novatos na profissão) ao produzir as matérias sobre blitze da Operação Lei Seca e sobre o atendimento do Samu. “Os entrevistados não queriam falar sobre o assunto que estávamos abordando”, lembra. Com Carolina Petená, 19 anos, não foi diferente: “No começo eu ficava meio frustrada porque não conseguia nada”. Mas a equipe não desistiu. Murillo Grant, 19, conta que driblou com insistência os obstáculos até conseguir o “sim” que queria, na apuração das blitze. “Tudo serviu pra ganhar mais confiança no que eu faço”, comemora.
Espírito de equipe
Lidar com a revista serviu como aprendizado e até como decisão futura de trabalho. Na etapa de passar os dados coletados para o papel, o grupo que cobria os locais mal assombrados de São Paulo enfrentou dificuldades: as ideias eram diferentes, e a maneira de escrever, também. “Esses fatores foram positivos para que aprendêssemos mais ou menos a respeito do método de trabalho em uma redação”, explica Isabela Neves, 21 anos. Talitha Adde, também de 21 anos e integrante do grupo, ressalta que foi difícil juntar todas as entrevistas e escrever um texto coerente. “Mas as dificuldades agregaram bastante, porque eu descobri técnicas que não conhecia”, completa.
Alguns alunos acabaram se enrolando com o prazo de entrega. Isabella Giordano, 19 anos, diz que parece fácil se organizar para uma reportagem mais extensa, mas não é. “É muito mais difícil do que parece. Você tem que achar a sua história e achar coisas interessantes que as pessoas vão querer ler.” Isabella Chiamulera, 19 anos, também correu contra o tempo, mas confessa que enrolou um pouquinho ao saber que o deadline era relativamente grande. “Se tivesse uma segunda chance, talvez eu começasse a escrever antes e a apurar sem correria. Me empenharia mais nesse ponto”, diz. Além do prazo de escrita, os compromissos universitários e pessoais também atrapalharam. “Como temos outras coisas da faculdade para fazer, ficou um pouco corrido. Tudo tem sua data certa, não dá para falhar”, completa Julia Arbex, 20 anos.
Vivências
Os alunos da Plural visitaram lugares inesperados e presenciaram cenas que jamais imaginaram ver ao vivo. Daniella Gemignani, 20 anos, e Mariana Saad, 19, cobriram uma noite na rua Augusta. Lugar visitado? Um prostíbulo. Daniella contou que o maior desafio não foi o da segurança, mas sim aplicar técnicas de entrevista para conseguir conversar com as prostitutas, que não queriam se expor. Muitas até ameaçaram as repórteres da Plural, temendo ter seus rostos e nomes verdadeiros publicados na revista. Feito o acordo de anonimato – e respeitado nesta edição –, a entrevista prosseguiu. “Lidar com essa coisa meio proibida foi um dos maiores desafios”, diz Daniella.
Para as duas repórteres, passar uma noite entrevistando garotas de programa foi inesquecível. “Saímos de uma vidinha protegida e fomos para a rua Augusta, de madrugada, entrevistar prostitutas. Isso abre a cabeça e tira o preconceito”, relata Daniella. Mariana concorda: “Eu as julgava mal antes de conhecê-las e aprendi a respeitar mais o trabalho delas. Foi uma quebra de tabu, com certeza”.
Barreiras internas e pessoais foram quebradas. Vencemos a timidez. Foi tudo uma questão de confiança em si mesmo. Sair do pequeno mundo em que vivemos foi uma das melhores coisas. “A gente ouviu muitas histórias de vida e de superação. Olhava para os problemas deles e pensava: é muita sorte ter tudo o que eu tenho”, comenta, emocionada, Marina Almeida, 19, relembrando sua matéria do Ceagesp.
Acreditar na nossa capacidade foi a chave do sucesso. Alunos que fazem o que amam, que colocam todas as forças num projeto e fazem isso acontecer – como esta revista, agora nas suas mãos, aconteceu.
Se repetiríamos a experiência? A resposta dos 19 alunos-repórteres é unânime: SIM!