De músico a luthier, Paulo Gomes conta sua história de vida

“Sou um rato de oficina”, afirma o luthier Paulo Gomes. Foto: Thayane Matos

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“Sou um rato de oficina”, afirma o luthier Paulo Gomes. Foto: Thayane Matos

Paulo Gomes Teixeira Neto, 54 anos, é dono do atelier de Luteria existente na Rua Marselhesa, número 387. Luteria é a arte de restaurar e construir instrumentos.

Foi com um jazz de fundo que começou a relembrar sua trajetória. O cenário não poderia ser melhor, palco das conquistas profissionais: o atelier de luteria. O local não é muito grande, com o cheiro da madeira e verniz invadindo o nariz. Habitat natural. Vida pessoal e carreira, uma entrelaçada à outra. A música é o tema principal E é o que fez sua história ser o que é hoje.

Presente

Hoje, o luthier aproveita seu tempo em casa, que inclusive é no mesmo quintal que o atelier. Ele afirma preferir seu ambiente caseiro do que o externo. Passa a maior parte do tempo trabalhando nos projetos, e gosta tanto de ficar com a mão na massa, que constrói coisas para a própria casa. Um exemplo disso é o aquário que criou para suas carpas. O amor pela natureza está nesses detalhes.

Paulo, apesar de ter focado sua vida na luteria, ainda gosta de fazer música. Junto com seu filho de 15 anos, toca forró. Mas não é algo que faz com frequência, pois desenvolveu tendinite.

Passado

Viajamos no tempo e chegamos a 1972. A trilha sonora agora é diferente. Paulo comprara seu primeiro disco com o próprio dinheiro, Meddle, do Pink Floyd. “Era aquele som que eu queria fazer”, lembra Paulo. E completa dizendo que ainda nem sabia qual era, mas o som pelo qual se apaixonara era o do baixo.

Em uma tarde do mesmo ano, chegou à aula de karatê do Colégio Marista Arquidiocesano, na Vila Mariana, com um amontoado de LPs. Seu professor, Celso, afirmou que gostava daquelas bandas também. Com isso, Gomes começou a frequentar a casa do tutor. Trocavam discos.

Um dia, Paulo viu um instrumento na cama e não sabia qual era, mas logo se interessou. O professor falou que era um baixo e que seu irmão o tocava.

Dois anos se passaram e Paulo, agora com 14 anos, resolveu então que tocaria baixo. Foi quando se lembrou do irmão de Celso. Foi até a casa e pediu para que lhe ensinasse. As tardes já não eram mais as mesmas. Gomes agora ficava com o novo amigo. Os toques que seu tutor dava o ajudavam e o rock reinava. Com o tempo, o recente músico foi descobrindo outros estilos musicais e se apaixonou pelo Jazz. De baixo elétrico a acústico.

Mudança

Mas houve um empecilho, uma pausa em sua carreira. Um ano no Exército fez com que o músico se afastasse dos palcos. Mas ao voltar, tudo o que queria era sair de casa. Não por problemas familiares, mas por querer independência. Nessa época, Paulo ampliou seus contatos. Tudo mudou ao conhecer Enzo Bertelli, luthier italiano. Esse acontecimento marcou seus 16 anos, quando Gomes tocava bastante nas noites da cidade.

Conhecer Bertelli foi a chance para mudar-se. Com ele, Paulo foi para o interior de São Paulo. Tatuí era seu novo cenário. Começou a aprender a arte da luteria. Mas logo quis abrir o próprio atelier. Voltou para o lugar da cidade que mais o agradava, a Vila Mariana. E foi o que fez. Juntou-se com um amigo, em 1980 e começou o próprio negócio.

Luteria

“O que eu estava descortinando para o futuro era ser músico”, afirma. Mas a luteria o encantou e foi no que focou.  Sua vida estava mudando. Ao invés do amigo, começou a trabalhar com a mulher, Edna. Ela ficou encarregada da administração, enquanto ele focava na produção e restauração dos instrumentos.  Foi nesse meio que conheceu diversas personalidades importantes do mundo musical. “Todos os caras que eu adorava, que admirava, acabei conhecendo”, explica. Todos esses contatos fez com que não tivesse necessidade de divulgar seu trabalho por aí, os próprios artistas espalhavam seu nome pelo mundo, já que eram famosos.

Há 35 anos, o atelier vem fazendo sucesso no bairro e no mundo. E Paulo afirma que seu amor pela natureza foi transmitido para seu trabalho. Diz que as formas dos instrumentos são inspirados nos elementos da natureza, por isso não usa linhas retas. Além disso, explica que a madeira usada é de extrema importância. É necessário ter uma idade certa para cada tipo de objeto fabricado. “O ambiente influencia em como a madeira da árvore será formada”, explica.

Futuro

Seus planos para o futuro já estão sendo traçados. Pretende, antes de aposentar, transformar o local em um Atelier Escola. “Mas preciso ter um patrocínio, porque é tudo muito caro”, explica que o ideal seria se uma empresa pagasse tudo e os alunos tivessem bolsa para estudar a luteria. “O que eu queria era ensinar as pessoas a restaurar, porque toda escola que existe de luteria só ensina a fazer o instrumento”, diz. Depois disso, iria parando aos poucos. E os caras que gostariam de ficar passariam o conhecimento aos novos alunos. Os mais avançados ajudariam os outros. Termina sua história então, dizendo que é “isso que queria para o negócio não morrer”.

O brilho nos olhos ainda está lá, não apagou, não sumiu. Seu amor pela profissão, pela música é completamente expresso no olhar. E a história dele não acabou. A trilha sonora de sua vida continua.

Saiba mais sobre o Atelier de Luteria aqui , em reportagem do Vila Mariana.

Thayane Matos, 3º semestre