A rotatividade dos técnicos no futebol

Renato, Luxemburgo e Felipão, técnicos vencedores sem clube Imagem: Divulgação

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A pressão pelo resultado imediato está acabando com a continuidade do trabalho dos treinadores de futebol

André Alonso, Arthur Pomares, João Pedro Cirilo e João Pedro Oliveira

O futebol mundial tem sofrido em todos os âmbitos e cargos com o imediatismo que nós torcedores temos perante resultados. Treinadores, jogadores, dirigentes e funcionários têm sido cada vez mais cobrados perante as várias deficiências de seus clubes.

Só para exemplificar, no Brasileirão de 2018, no período de 19 rodadas, dos 20 clubes que participaram, 19 técnicos foram demitidos ou saíram de seus clubes. Foram somente três treinadores que sobreviveram em seus cargos até o final daquele ano: Mano Menezes(Cruzeiro), Renato Gaúcho(Grêmio) e Odair Hellmann(Internacional).

Hoje, mesmo na Europa, diversos técnicos de renome vêm saindo precocemente de seus trabalhos. É o caso de José Mourinho, recém anunciado pela Roma, que a pouco tempo estava no Tottenham Hotspurs da Inglaterra, saindo com 44 vitórias, 19 empates e 23 derrotas, um número que não chega a ser ruim, mas que tirou o clube da briga pela vaga na Liga dos Campeões. Mas por outro lado, o momento dessa saída pode ter prejudicado o clube, pois aconteceu a menos de uma semana da final da Copa da Liga Inglesa contra o Manchester City de Guardiola, que ganhou de 1×0.

Anúncio de José Mourinho no Tottenham – Foto: Site Oficial do clube

Na Europa, a continuidade do trabalho é muito respeitada. Um exemplo muito claro disso é do alemão Jürgen Klopp, que virou o comandante do Liverpool em 2015 e nos primeiros 3 anos de trabalho não venceu nenhum título, até que na temporada 2018/19 os Reds começaram a colher os frutos plantados pelo treinador. Ganharam 4 títulos em 2 anos, incluindo a Champions League e a Premier League, taça que não era levantada pelo clube a 30 anos.

A instabilidade é algo comum no futebol, a gente até pode ter um time que domina certo período, mas inevitavelmente, esses clubes também irão perder. Temos diversos exemplos disso, desde Santos de Pelé, Barcelona de Guardiola e Real Madrid de Zidane, que foram equipes espetaculares, porém que em determinado momento foram derrotadas.

No Brasil, os clubes que frequentam a primeira divisão do campeonato nacional estão ficando cada vez mais estruturados, e consequentemente, estão deixando a competição mais equilibrada. Portanto, é normal que equipes de menor expressão comecem a surpreender e ganhar jogos. Já vemos clubes como Bahia, Athletico Paranaense e Ceará com ótimos elencos e figurando entre meio de tabela e zonas classificatórias, enquanto clubes como Vasco, Botafogo e Cruzeiro estão na segunda divisão.

Com um campeonato mais equilibrado, diversos clubes que figuram entre os mais fortes, acabam perdendo, e a culpa sempre vai para seus técnicos e jogadores. Porém, isso faz parte do esporte, o que traz estabilidade e vitórias são o planejamento e a continuidade. Podemos ver clubes que são exemplos aqui no futebol brasileiro, como o Grêmio que teve um passado recente vitorioso nas mãos de Renato Gaúcho, que ficou 5 anos na equipe gaúcha.

Renato Gaúcho e suas faixas de campeão
Por: Divulgação Grêmio

Em participação no programa Mesa Redonda, da TV Gazeta, Dorival Júnior criticou o momento vivido pelos técnicos: “É triste ver isso. É impossível ter condições de avaliar um trabalho de maneira correta. Infelizmente, no Brasil, nós não fazemos trabalhos, temos que gerar resultados. As pessoas falam que o futebol sempre foi assim, mas começou a ser assim de uns 20 anos para cá. Acho que essa impaciência é muito grande, há uma série de fatores que interferem diretamente”.

Atualmente no futebol brasileiro, a maioria dos clubes apresentam dívidas milionárias, o que acaba tornando difícil que os clubes mantenham elencos fortes e estruturados ano após ano, visto a necessidade da maioria dos times de sobreviverem a partir da venda de seus jogadores.

No entanto, quando a fase não é boa e os resultados não vem, é muito mais fácil para os clubes demitir os seus treinadores, que são vistos em sua enorme maioria como descartáveis, em comparação aos seus dirigentes e alterar toda uma gestão. Um exemplo muito claro dessa situação foi vista no time do Cruzeiro em 2019, quando a complicada situação financeira da instituição veio à público e a equipe deixou de apresentar resultados. A solução encontrada pela diretoria foi demitir o técnico Mano Menezes, que havia sido bicampeão da Copa do Brasil pelo clube e estava prestes a completar 3 anos no cargo, ao invés de tratar o problema mais grave que se apresentava fora das 4 linhas com uma diretoria corrupta que havia causado um déficit de mais de R$800 milhões aos cofres do Cruzeiro.

Mano Menezes
Por: Douglas Magno/BP Filmes

Esse imediatismo e resultadismo do torcedor acaba interferindo muito no trabalho dos treinadores, uma vez que a falta de paciência com a falta de resultados acaba impondo uma pressão muito grande nos treinadores e na própria direção dos clubes para mandá-los embora. Isto acabou acontecendo ano passado com Tiago Nunes no Corinthians, já que no fim de semana, o presidente do clube havia dado uma entrevista coletiva dando total respaldo ao treinador, mas uma derrota no meio de semana para o maior rival Palmeiras por 2 a 0 em casa com protestos contra o time e seu comandante do lado de fora do estádio em plena pandemia, acabaram fazendo com que a direção cedesse à pressão da torcida e demitisse o técnico.

Um caso recente aqui no Brasil, que reflete bem o que estamos falando, é o do treinador argentino Ariel Holan. O técnico chegou ao Brasil para treinar o Santos, depois de ter sido campeão Chileno com a Universidad Católica, e considerado o melhor treinador do campeonato. Holan desembarcou na Vila Belmiro em fevereiro, oscilou um pouco, por ser início de trabalho, ter um grupo muito jovem na mão e ainda ter que lidar com um transfer ban da equipe, que por conta de dívidas na FIFA não podia contratar jogadores. No fim de abril, pouco mais de dois meses depois de assumir a vaga no comando santista, Ariel pediu demissão por, segundo ele, não atender às expectativas. Um grupo de “torcedores” soltaram fogos em frente ao prédio do argentino após a derrota no clássico contra o Corinthians, o deixando muito irritado. Esse foi outro fator que culminou em sua saída do Peixe.

Isso só prova que existe muito a evoluir ainda. A mentalidade e o entendimento do futebol precisam mudar, o treinador não é um mágico, não resolverá tudo do dia pra noite. Como todo trabalho, é necessário tempo para que os resultados comecem a aparecer, e isso somente acontecerá com o apoio da diretoria dos clubes, mas especialmente de seus torcedores.