Fruto da era digital, “cultura stan” cria nova imagem do apoiador fanático

Imagem: Unsplash

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Theo Fava (2º semestre)

Mais de 15 anos após a sua criação, a rede social Twitter ocupa um importante espaço no mundo digital, sendo o 9º website mais visitado em 2021, segundo a plataforma Statista. Entre as diversas peculiaridades que o site tem, uma que cresceu bastante nos últimos anos é a das grandes comunidades de fãs twitteiros. Há diversos agrupamentos dedicados à idolatria por certas celebridades e figuras públicas. Entre eles se destacam especialmente os artistas de K-Pop, maior gênero musical da Coreia do Sul, e grandes cantoras norte-americanas, como Ariana Grande e Lady Gaga.

Nos últimos anos, usuários da internet têm atribuído o termo “stan” para o conceito de fãs apaixonados e até mesmo obsessivos no espaço digital. A palavra, no entanto, sempre careceu de uma definição menos ampla. “Ela tem algumas vertentes de pensamento. A primeira é que ela se relaciona muito com a ideia original de fã, de quando os fãs eram aquelas pessoas fanáticas que perseguiam, gritavam e rasgavam a roupa dos seus ídolos”, disse a Dra. Clarice Greco, pesquisadora da área de comunicação pela Universidade Paulista. Greco também acredita que, apesar dessa crença, o conceito de “stan” não precisa ser negativo, pois os estudos de fãs trouxeram uma visão mais moderada em que um laço afetivo já é importante para se tornar um. “É possível ser uma pessoa absolutamente padrão em várias esferas da vida e ser stan”, completou.

Segundo o pesquisador Dr. Paul Booth, fazer parte da cultura stan pode trazer um sentimento de comunidade e conexão. “Uma das coisas mais importantes sobre como a internet contribuiu para essa cultura é que ela reuniu grandes grupos de pessoas. Sei que parece óbvio, mas sem ser capaz de se reunir e encontrar conexão em torno de um texto ou celebridade em particular, um grupo de pessoas nunca pode se tornar uma grande comunidade”, disse.

O agrupamento de fãs em multidões para alcançar um objetivo, no entanto, pode ocorrer com a intenção de agressivamente atacar pessoas ou instituições. Em 2017, a rapper americana Cupcakke foi vítima de ataques e ameaças de morte por fanáticos da boy band BTS, após um membro do grupo, Jungkook, ser objeto de comentários sexuais da artista. Depois do incidente, ela expressou uma piora em sua saúde mental, e logo em seguida desativou sua conta no Twitter para evitar o assédio moral que estava sofrendo.

Para o Dr. Mark Duffett, da University of Chester, no entanto, quando a imprensa fala sobre fãs, os jornalistas tendem a falar em generalizações apoiadas em quaisquer exemplos de casos que eles queiram: “As pessoas querem usar o termo ‘stan’ porque para elas é divertido e aponta para a ansiedade que têm sobre o comportamento individual e de grupo nas redes sociais”.

A imagem de obsessividade e toxicidade que tem sido associada a essas comunidades já está implícita na origem do termo, que vem da canção Stan, do rapper americano Eminem, lançada em 2000. A letra da música se trata de uma narrativa fictícia sobre um fã obsessivo de Eminem, que após muitas cartas escritas ao rapper sem resposta, entra em um episódio maníaco resultando em suicídio e na morte de sua namorada grávida. O nome do protagonista, “Stan”, acabou servindo como inspiração para o conceito de fãs fanáticos por seus ídolos, e ao longo dos anos o termo foi sendo banalizado até perder a tenebrosidade de seu significado original. A imagem da comunidade, no entanto, tem voltado a ser negativa, em razão de diversos incidentes que geram atração na mídia.

“Claro que usuários de mídia social, músicos, comentaristas e fãs pegaram o termo, com vários graus de conhecimento e paródia, e ele se tornou parte do repertório porque existe como um termo amplamente aceito e disponível para falar sobre a atividade do fã. Na minha opinião, no entanto, é descuidado e depreciativo, mesmo quando adaptado, porque perpetua estereótipos imprecisos de comportamento do apoiador”, acrescentou Duffett.

“Desde que me tornei parte da cultura stan, com o passar do tempo, ela se tornou mais estressante. Quando entrei aqui pela primeira vez, os argumentos desnecessários eram muito tímidos. Mas quando a comunidade cresceu, o caos também aumentou“, disse a internauta Surhyun.

A usuária do Twitter é fã de Red Velvet, grupo de K-Pop composto por cinco mulheres, e o quinto maior artista do gênero no Spotify. Surhyun descobriu a comunidade de stans no twitter quando estava pesquisando sobre o grupo após se interessar pela primeira vez. Ela decidiu, então, começar a seguir páginas de outras participantes da comunidade stan para conseguir atualizações sobre o grupo com mais facilidade, e depois de um tempo transformou sua própria conta nisso. Eventualmente, começou a escrever “fanfictions”, que são histórias fictícias, envolvendo as integrantes do grupo.

Apesar de comentar que o cotidiano dela na comunidade pode chegar a ser “caótico e tóxico”, Surhyun afirmou que o efeito de sua participação acaba sendo geralmente positivo: “Conheci muitas pessoas e de diferentes etnias, o que ampliou minha perspectiva sobre as coisas. Posso dizer que a cultura stan contribuiu muito para o meu crescimento como pessoa.”

Sobre o futuro da cultura stan, Dr. Booth finalizou: “Acho que a cultura stan continuará a se desenvolver e mudar com o tempo, mas nunca deixaremos a ter essas comunidades de fãs, elas existem desde sempre e existirão enquanto houver pessoas que se apaixonem por sua mídia”.