As diferentes formas de olhar: Artesãos não querem empreender, querem criar

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Renan Nunes – (2º semestre)

“Nós”. Esse é o termo utilizado por Gabriela Maria, de 21 anos, para definir a comunidade de artesãos de rua da qual faz parte. A jovem que não tem formação prévia em artes ou artesanato se interessa pelo ofício desde muito pequena. “Eu sempre tentei me encontrar em outras profissões, mas algo na arte me atraía de uma maneira diferente”, afirma.

No Brasil, atualmente, existem cerca de 8,5 milhões de artesãos, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Desse número, quase 93% têm o artesanato como principal fonte de renda e não desempenham outras atividades paralelas ao trabalho manual. Além das barracas na rua, muitos produtores recorrem a redes sociais, feiras de exposição e lojas de terceiros para poder vender seus produtos.

Esse também é o caso de Andrea Freitas, de 24 anos. A artista e vendedora ambulante enxerga na arte uma forma de expressão e conexão entre a matéria e o espírito. Em sua barraca localizada na Avenida Paulista próximo ao Masp e o Parque Trianon, Andrea vende incensos, pedras e outras artesanatos com plantas e essências naturais.

Quando questionada sobre suas perspectivas para o futuro, Freitas deixa bem claro: “Não quero transformar isso em um negócio. Sou artista e não empreendedora”. Sua opinião é a mesma de uma série de outros artesãos que vendem suas produções na zona oeste de São Paulo, para esses profissionais, o ofício do artesanato vai além de uma simples ocupação, mas passa a ser também um estilo de vida.

A opinião incisiva da vendedora vai ao encontro da posição de Beatriz Martins, de 26 anos. Ao ficar desempregada passou a receber o auxílio emergencial concedido pelo Governo Federal durante a pandemia. Porém, com o fim do benefício em abril, pegou a última parcela de R$ 300 e investiu parte em miçangas, biscuit e materiais para artesanato.

Suas atividades se iniciaram em meio a pandemia. No começo, Beatriz relatou que o medo era seu principal companheiro. “No auge da pandemia eu precisava pegar transporte público, montar barraca e oferecer meus produtos para as pessoas”, diz. “Na época, ainda tinham poucas pessoas na rua, então, além de tudo, a segurança era uma questão”.

Beatriz que atualmente trabalha apenas com artesanato também conta com o apoio do namorado – que se encarrega das questões burocráticas, como contabilidade, logística e controle dos materiais e documentações legais. O último ponto, em particular, é um desafio a parte para o casal. Segundo os dois, o Sindiarte (Sindicato dos Artesãos da Cidade de São Paulo), não tem recebido novos cadastros desde 2021.

Para ambos, o cadastramento seria essencial para obtenção do alvará de sua barraca, que atualmente fica na Avenida Paulista a mercê da fiscalização e outros órgãos reguladores. “Nós tentamos entrar em contato com a prefeitura, com o Sindiarte e outros centros de apoio, mas ninguém conseguiu nos ajudar de fato”, relata. “Quando a fiscalização passa por aqui, sempre precisamos explicar com cuidado nossa situação”.

Sobre o futuro, Beatriz o enxerga com muita esperança. “Não quero transformar isso em algo grande. Gosto de saber que cada peça vendida aqui passou pelas minhas mãos, que tem um pouco da minha identidade”, afirma. “Quem sabe um dia ter uma loja física ou algo do tipo, mas também acho legal estar por aqui, fazendo parte da rua”.