Viagem no tempo

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Milena da Silva

Para entender essa história é preciso viajar no tempo. No ano de 1898, em pleno Carnaval, o Teatro São José, que ficava na praça João Mendes, no Centro de São Paulo, pegou fogo e ficou completamente destruído. Esse era o lugar onde as companhias estrangeiras eram recebidas. Por isso, o incidente foi motivo para a Câmara Municipal tirar do papel um projeto que a elite paulista já planejava: a construção de um centro cultural para assistir concertos e óperas com influência europeia.

No dia 26 de junho de 1903, iniciou-se a construção do Theatro Municipal, que foi projetado pelos arquitetos Ramos de Azevedo, Cláudio Rossi e Domiziano Rossi. A estrutura foi pensada a partir da Ópera de Paris, projeto do arquiteto Charles Garnier. No episódio 1 do vídeo Theatro Municipal – Memória Viva de São Paulo, disponível no Youtube, a arquiteta Lilian Jaha relata que o teatro foi construído com as técnicas mais modernas que existiam na época. “As estruturas das fundações foram feitas em tijolos de barro e concreto, e a estrutura da cúpula, por exemplo, foi feita em aço e veio da Europa”.

Só então, em 1911, oito anos depois, as obras se encerraram. A inauguração do Theatro aconteceu no Morro do Chá, dia 12 de setembro, e teve como abertura a Ópera de Hamlet, obra do compositor francês Ambrósio Thomas. De acordo com Lilian Jaha, o evento era para ter sido realizado no dia 11, porém houve um atraso com a chegada dos cenários que vinham da Argentina. É válido ressaltar que São Paulo estava em um momento de crescimento econômico com a cultura cafeeira, e após esse evento marcante, a cidade passou a ser parte do itinerário das grandes óperas internacionais.

Em 1922, o Theatro Municipal foi palco da Semana de Arte Moderna, um dos maiores eventos da história da arte no Brasil. “A Semana de 22, objetivamente, consistiu em três dias alternados, com leitura de poesia, conferência, espetáculo de música e uma exposição de algumas pinturas no saguão do teatro. Ela tem o tamanho que tem por causa da construção histórica que foi sendo feita em cima dela e que elevou a categoria de evento superior. Na verdade, no momento foi uma coisa bem restrita de alcance muito local, apenas para uma pequena elite culta da cidade de São Paulo”, relata Luís Augusto Fischer, professor, escritor e ensaísta. Ele completou dizendo que o teatro era o ambiente mais requintado da cidade naquele ano, era o grande orgulho da elite e que o evento só podia ter sido feito ali.

Restauração

Na década de 1950 houve a primeira restauração do Theatro Municipal, visando aprimorar a bilheteria, camarim, sala de espetáculos, o palco, entre outros espaços. Algumas dessas mudanças foram: a divisão da bilheteria em dois setores, um para a plateia e camarote, e o outro para a galeria e a sala circular, conhecida como anfiteatro (para isso, foi construído um elevador e uma escada com acesso a esses locais); aumento de espaço dos camarins, do palco e a reestruturação da sala de espetáculos; modernização de equipamentos cênicos; as poltronas também foram arrumadas para que a plateia não ficasse em pontos cegos e surdos da sala.

Em 1986, sob responsabilidade do Patrimônio Histórico do Município, o teatro passou por outra restauração. Dessa vez, toda a parte elétrica do espaço foi trocada, e um processo delicado foi feito para que a obra de Oscar Pereira da Silva não desabasse do teto. Alguns equipamentos também foram trocados por outros mais modernos, como os de som e de luz. Além disso, a fachada do Theatro foi renovada, e então, em 1991, aconteceu a reinauguração do Municipal, como forma de comemorar seus 80 anos.

O teatro foi tombado em 1981, ou seja, teve reconhecimento e proteção por ser o patrimônio cultural mais conhecido, pelo órgão de preservação de São Paulo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico). Por fim, em 2008, o Theatro Municipal passou por sua última reforma, que durou dois anos e oito meses. Novamente os equipamentos foram substituídos por outros mais modernos, e os vitrais, pinturas, pisos, o palco, iluminação, poltronas, o entorno no geral, também foram modificados.

Em comemoração aos 100 anos da Semana de Arte Moderna, nos dias 10 a 17 de fevereiro de 1922, o teatro preparou uma programação especial com apresentações da Orquestra Sinfônica Municipal, do Coral Paulistano, do Balé da cidade e do Quarteto de Cordas, além de óperas, coral, shows, sarau, exposições, debates, mesa redonda, e outros movimentos artísticos. Alguns deles estão disponíveis no Youtube, no canal do Theatro Municipal. Artistas como Chris Tigra, Allan da Rosa, José Miguel Wisnik, Dona Onete e DJ Ju Salty participaram desses eventos.